10.4.12

Nota de leitura


Mar me quer numa reedição de luxo
"Mar me quer", o conto que o escritor moçambicano Mia Couto escreveu em 1998 para a Exposição Mundial de Lisboa, foi reeditado pela Caminho. Desta vez as palavras de Mia vieram a público acompanhadas das ilustrações do pintor João Nasi Pereira.
Uma vez mais somos, em "Mar me quer", transportados para um espaço reinventado por Mia Couto. É nesse espaço, localizado no litoral de Moçambique, "um lugar arrependido de ser chão, convertido ao vai e vém das marés. Ali na dobra do Índico", que se passa a história de amor de Zeca Perpétuo, "um refomado do mar" e da sua vizinha, a mulata Dona Luarmina.
"Esta é uma história sobre a qual não é possível fazer grandes filosofias", defeniu o próprio autor. Mas é através do ondear das palavras e das imagens por elas construídas que percorremos, também, as recordações de infância do escritor, às quais "quer seja pelo exercício da escrita quer seja pela educação da infância, eu estou sempre regressando", como escreveu Mia Couto nas "Águas do meu princípio", um texto escrito por ocasião da Expo' 98 e que o autor relembrou no lançamento da nova obra.
Lado a lado, as ilustrações do pintor moçambicano João Nasi Pereira acompanham a história de Mia Couto. Para o artista esta ligação a Mia "é uma ligação de coração. É a ligação da terra", explicou.
"Através do encantamento da prosa de Mia Couto, uma prosa que é mais poesia que prosa, temos a visão de um filho de europeus sobre a África. Uma visão entranhada e africanizada que um desterrado, como eu, já perdeu. É uma forma tão sonhadora de ver a realidade que eu não consigo deixar de sonhar quando a leio". E, quando sonha, Nasi Pereira pinta.
"Porque é que gosto tanto do Mia?", questiona o pintor. A resposta surge pronta: "porque ele responde de uma forma exemplar às nossas grandes inquietações. É nos seus livros que encontro a tranquilidade possível e é por isso que fico profundamente alterado por ele me escolher para pintar os livros dele". E acaba por confessar que "gostava de pintar toda a obra de Mia".

Um sentimento de tristeza por e em Moçambique
Em Lisboa, na apresentação de "Mar me quer", Mia Couto fez questão de relembrar o assassinato do jornalista Carlos Cardoso, de quem era amigo, e a morte por asfixia de mais de 80 pessoas numa prisão moçambicana.
Para o escritor, "Moçambique está a viver um período triste". Sentimento que lhe provoca "esta espécie de desalento que me faz interrogar sobre que sentido tem isto de escrever", como acabou por confessar.
Mas a interrogação que faz não lhe tira a vontade de preencher novas páginas com a sua prosa, primeiro porque "não misturo as coisas", depois porque "sou sensível mas não sou frágil".
O lançamento de uma nova colectânea de contos nos meses de Abril/ Maio de 2001, vem comprovar as palavras de Mia Couto. Ainda este ano o autor não põe de lado a saída de um novo romance.


http://www.ccpm.pt/rev28_marmequer.htm